Eu gostava de puder adaptar o mundo. Ou melhor gostava que o mundo não tivesse de ser tão relutante à mudança. Num epísódio, duma série que gosto - Touch - Jake, uma criança autista, que faz sempre a narração do início dos episódios, começa por dizer que os seres humanos são muito resistentes à mudança, mas que se esquecem constantemente que o "agora" não existe, que cada momento que já passou é diferente do anterior e do futuro. E por momentos, entenda-se nanosegundos. Ora, esse início do episódio fez tanto sentido, que só por aí já valeu o episódio. Porque realmente nada é constante, tudo é diferente do que era à bocadinho e do que vai ser daqui a nada. Pensar no que o mundo já mudou desde que comecei a escrever este post é fantástico e, também, confesso, assustador. No entanto, pelo lado positivo da coisa, se todos pensassemos nisso, penso que este mundo seria muito mais tolerante. Muito mais adaptável. Se o mundo muda, naturalmente, a cada nanosegundo, quem somos nós para ditar "regras" no mundo. Se eu continuasse e me entusiasmasse pelo tema "regras do mundo" ia, concerteza, de encontro a um texto que escrevi e deixei aqui sobre a nossa não-liberdade pessoal. Mas vendo por outro prisma, posso apenas deixar a questão, se o mundo é tão naturalmente móvel, repentino e ele próprio adaptável ao desconhecido, ao perigoso, ao diferente, porque é que nós "seres do mundo" não o somos?
E porque demoramos tempos a nos adaptarmos a pessoas de outra cor de pele? Porque demoramos tempos a nos adaptar à mulher no ambiente de trabalho? Porque é que ainda hoje é estranho ser um homem a cozinhar e arrumar a casa, e ainda os chamam de "prendados" e "um achado"? Porque é que ainda hoje não aceitamos um casal homossexual? Porque é que é senso comum que um filho adoptado por dois pais ou duas mães vai viver num ambiente familiar desadequado? E porque é que sempre que passamos por crianças, ou adultos com deficiências desviamos o olhar?
Se isto não é resistência à mudança e adaptação então somos seres mais estranhos do que pensava. Eu não sou exemplo, muito do que enumerei também já o fiz, ou ainda o faço. Mas estou a fazer um esforço. Um esforço por ser um ser dum mundo que é naturalmente adaptável, um ser que vive num planeta cuja natureza muda sem qualquer dificuldade. E, assim, eu faço o meu esforço por ser adaptável, como todos os outros animaizinhos e vidas biológicas, umas grandes, outras muito pequeninas que por aí andam. E invejo essas vidas biológicas que por aí andam, porque tenho a certeza que uma E. coli, um Helycobacter pilory, um leão, uma baleia, nunca iriam desprezar outro que estivesse no seu meio, a não ser pelo seu próprio instinto de sobrevivência. E que eu saiba negros, asiáticos, pessoas com deficiencias, gays, lésbicas ou bissexuais, por nascerem não roubam mais ar do que qualquer outro ser humano.
Parabéns!
ResponderEliminarMuito bom este texto. Começas por falar numa série que me apaixonou. Depois, adaptas essa ficção a uma realidade muito presente e com perguntas muito interessantes. Gostei muito.
homem sem blogue
homemsemblogue.blogspot.pt
Obrigada! É tão bom ter assim um feedback :)
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